A temperatura pode afetar a atividade dos vírus?
Escrito e verificado por a bióloga María Muñoz Navarro
Devido aos eventos atuais relacionados ao SARS-CoV-2, somos assaltados por milhares de preocupações que nos fazem pensar sobre que vírus é esse, como ele é transmitido ou o que podemos fazer para não sermos infectados. Também podemos nos perguntar: o que mais favorece a atividade dos vírus: o frio ou o calor?
Em 2003, houve um surto de coronavírus em Hong Kong que se espalhou para muitos países. Então, os cientistas estudaram como os fatores climáticos afetaram a transmissão.
A seguir, vamos mostrar como a temperatura influencia a atividade dos vírus e outros dados interessantes.
A temperatura e os organismos
A temperatura é o fator ambiental mais importante que afeta a saúde de todos os organismos, pois os seus efeitos afetam o crescimento e o desenvolvimento da patogênese de forma imediata.
As mudanças de temperatura podem afetar tanto a biologia do hospedeiro quanto a do parasita (vírus). De fato, o impacto das mudanças climáticas está relacionado a inúmeras doenças infecciosas.
Alguns dos surtos mais mortais de doenças infecciosas virais são o Ebola, o HIV e o coronavírus, que causa a SARS (síndrome respiratória aguda grave).
Efeitos da temperatura
Os vírus são termolábeis, isto é, eles são destruídos quando atingem uma temperatura elevada. Por isso, a maioria dos vírus é inativada quando aplicada a uma temperatura entre 50-65 °C durante meia hora.
Isso ocorre porque as altas temperaturas causam a desnaturação das proteínas que compõem o capsídeo (estrutura proteica que envolve e protege o material genético).
No entanto, existem exceções. Por exemplo, os vírus da hepatite B são inativados a 120 °C durante 30 minutos. Ou também ao administrar 15 Ib de pressão, atuando como desinfetante, ou ao aplicar glutaraldeído ativado a 2°C.
Os vírus são estáveis em temperaturas baixas. A -75°C, eles permanecem ativos durante meses, enquanto a -196°C, eles podem permanecer ativos durante anos.
A seguir, vamos mostrar como a temperatura afeta a sobrevivência de alguns vírus que causam doenças infecciosas.
O caso do coronavírus
O SARS-CoV foi uma doença emergente associada a uma pneumonia grave, causada por coronavírus, que se espalhou para 20 países nos 5 continentes em 2003. O surto surgiu em Amoy Garden, em Hong Kong, em um prédio de apartamentos onde mais de 300 moradores foram infectados.
A mortalidade causada foi de 9%, e os idosos foram os mais afetados. No ambiente hospitalar, o número de casos aumentou devido ao contato entre pacientes, profissionais da saúde e fômites (objetos inertes que transmitem patógenos em hospitais, tais como estetoscópios, máscaras, lençóis, etc.).
Temperatura e SARS
A principal via de transmissão da infecção por SARS-CoV são as gotículas respiratórias, que se propagam pelo ar através da tosse ou espirros, mais conhecidas como ‘gotículas de Flugge’.
Segundo um estudo publicado na revista Applied and Environmental Microbiology, esse vírus foi encontrado em superfícies lisas e objetos hospitalares, onde persistiu durante até 28 dias em temperaturas entre 22°C e 25°C. No entanto, foi inativado com a aplicação de uma temperatura de 40°C.
Na revista Advances in Virology, outro artigo afirma que:
- O vírus permaneceu estável durante 3 semanas à temperatura ambiente e morreu quando uma temperatura de 56°C foi aplicada durante 15 minutos.
- A incidência de SARS aumentava nos dias em que as temperaturas ambientes caíam em Hong Kong e em outras regiões subtropicais.
- Também foi apontado que, em Singapura, que fica em uma área tropical, houve uma maior incidência de surtos de SARS nos hospitais devido ao uso do ar condicionado.
Uma vez que o vírus pode permanecer ativo durante 2 semanas em temperaturas frias, o que também facilita a transmissão, em Guangzhou os médicos decidiram manter as janelas abertas. Dessa forma, os quartos eram bem ventilados. Isso significou uma redução na sobrevivência e transmissão do vírus.
É válido destacar que em alguns países asiáticos em regiões tropicais, tais como Malásia, Indonésia ou Tailândia, onde as temperaturas são altas, não houve casos de surtos de SARS.
Outros fatores ambientais, como velocidade do vento, luz solar, umidade relativa e pressão do ar, também estão associados à epidemia de SARS.
A contaminação ambiental e os fômites desempenham um papel importante na transmissão do vírus e contribuem para a infecção hospitalar.
O que acontece com outros vírus
Influenza: a propagação do vírus influenza (gripe) depende tanto da umidade relativa quanto da temperatura. Assim, condições frias e secas favorecem a transmissão, o que coincide com o período sazonal do inverno.
Dengue: nesse caso, o vírus depende do vetor (mosquito Aedes). Em grandes altitudes, onde as temperaturas são baixas, o vírus não completa o período de incubação durante a vida do mosquito, de modo que a transmissão é limitada pela temperatura do ambiente.
O período de incubação extrínseco ocorre a uma temperatura de 25°C e a pós-infecção a 30°C. Esses mosquitos também transmitem o vírus da chikungunya e o vírus da febre amarela. Por causa das mudanças climáticas, esse inseto já foi encontrado em diferentes locais que geralmente não frequentava, permitindo a transmissão descontrolada dos vírus.
Além da temperatura, também existem outros fatores ambientais que podem afetar a atividade dos vírus.
Agentes físicos
- Radiações. Tanto a radiação ionizante (raios-X) quanto a radiação não ionizante (luz ultravioleta) causam alterações (quebras) na cadeia nucleotídica do material genético dos vírus.
Agentes químicos
- Solventes lipídicos. Existem vírus que possuem um envelope formado por uma dupla camada lipídica (vírus envelopados) e, por isso, podem ser facilmente inativados com o uso de solventes de gordura (clorofórmio, éter…). Aqueles que não possuem esse envelope (vírus nus) são resistentes a esse tipo de solvente, mas são sensíveis a agentes oxidantes (ácido clorídrico e ácidos em geral).
- pH. Os vírus são muito sensíveis a mudanças drásticas no pH. Eles permanecem ativos entre um pH de 5 e 9. Abaixo ou acima desse intervalo, são inativados.
A atividade dos vírus: a temperatura é um fator determinante
Em conclusão, a temperatura é um fator determinante na viabilidade dos vírus. A maioria é inativada em altas temperaturas, enquanto o clima frio e seco favorece a sua replicação e transmissão.
Os ambientes hospitalares são considerados um foco de contaminação porque os vírus e outros patógenos são capazes de permanecer nas superfícies dos quartos e objetos. Isso contribui para a contaminação dos pacientes e dos profissionais da saúde.
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