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Ágnatos ou peixe sem mandíbula: tudo o que você precisa saber

7 minutos
Acredita-se que a mandíbula possa ter se originado de uma malformação dos primeiros arcos branquiais. De fato, os ágnatos fornecem importantes informações, apresentando pequenas modificações que parecem confirmar essa teoria.
Ágnatos ou peixe sem mandíbula: tudo o que você precisa saber
Cesar Paul Gonzalez Gonzalez

Escrito e verificado por o biólogo Cesar Paul Gonzalez Gonzalez

Última atualização: 22 dezembro, 2022

O grupo dos vertebrados recebe esse nome graças à presença da coluna vertebral. Como existem muitas espécies que atendem a essa e outras características, foi necessário classificar em grupos menores cada um dos organismos. Dentre todos eles, os peixes que compõem o grupo dos ágnatos são caracterizados pela ausência da mandíbula, o que parece indicar um indício de seu passado evolutivo.

Esses peixes apareceram pela primeira vez há cerca de 470 milhões de anos. Eles dominaram a Terra por muito tempo, pois eram os únicos vertebrados na época. Atualmente, esse grupo de peixes sem mandíbula se encontra reduzido, pois a maioria das espécies está extinta, restando apenas lampreias e mixinídeos. Se você quiser saber mais, continue lendo.

O que é um ágnato?

O termo ágnato abrange um grupo biológico que reúne os vertebrados que não possuem mandíbulas. Seu nome vem do grego agnatha, “a” (sem) e “gnatha” (mandíbulas). De acordo com o Instituto de Biologia da UNAM, esse táxon inclui 108 espécies atuais e um grande número de fósseis.

Em relação à sua história evolutiva, os ágnatos estão localizados pouco antes do aparecimento da mandíbula, mas após o surgimento da notocorda e do crânio. Eles tiveram grande sucesso reprodutivo no Devoniano, porém no final do período suas populações se reduziram drasticamente.

Características físicas

O ágnato típico é um animal aquático com características primitivas. Sua boca é circular, semelhante a uma ventosa com dentes ao redor. Esses peixes são capazes de aplicar uma força de sucção suficiente para abrir feridas nos tecidos de outros animais. O formato físico do ágnato lembra o de um verme alongado sem escamas, que pode ultrapassar um metro de comprimento.

Seu corpo é principalmente cartilaginoso, embora alguns ancestrais tivessem esqueletos e escamas ósseas. Os ostracodermes, ágnatos extintos, tinham até escudos couraças ósseas ou que lhes permitiam se defender. No entanto, essa defesa não foi suficiente contra os peixes com mandíbula, o que se acredita ser um dos motivos pelos quais eles desapareceram rapidamente.

O que é uma lampreia?

Bastante semelhantes a uma enguia, as lampreias são espécies capazes de habitar tanto águas doces como salgadas. Seu corpo é comprido, vermiforme e flexível, por isso conseguem nadar com movimentos ondulatórios, quase como os de uma cobra. Em sua maioria, são ectoparasitas, pois se fixam nas presas através de suas bocas, alimentando-se do sangue ou dos tecidos do animal.

Sua boca funciona como uma verdadeira ventosa, com a qual o peixe adere fortemente à sua presa para se alimentar. Seus dentes permitem rasgar a pele o hospedeiro e algumas espécies possuem uma língua capaz de raspar os tecidos. Dessa forma, a lampreia consegue se alimentar, considerando-se uma ameaça à ictiofauna.

Esses animais sanguinários têm uma presença maior nos mares do Atlântico Norte. São espécies de cor marrom, com tons amarelados e manchas escuras. Podem atingir 120 centímetros de comprimento, dependendo da espécie.

 

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Habitat das lampreias

Esses ágnatos têm a capacidade de resistir a ambientes salinos e de água doce, embora seu ciclo de vida abarque ambos os ambientes. Eles desenvolvem sua vida adulta nos mares e retornam aos rios para acasalar e se reproduzir, considerando-se espécies anádromas. Esse termo significa literalmente ‘que vive no mar, mas retorna aos rios para desovar’.

As lampreias se dividem em marinhas ou fluviais, dependendo da área em que a espécie passa mais tempo. Vamos conhecer um pouco de cada um desses grupos nas linhas a seguir.

Lampreias marinhas

Entre as espécies que passam a maior parte do seu ciclo de vida no mar, podemos encontrar as seguintes.

Lampreia chilena

Cientificamente, essa espécie é conhecida como Mordacia lapicida. Apresenta uma fase larval, durante a qual vive enterrada na costa dos rios, migrando em direção ao mar no inverno. A desova geralmente ocorre no final da primavera e início do verão, em rios turbulentos.

Essa espécie é endêmica do Chile e pode medir até 35 centímetros de comprimento. Geralmente, apresenta uma condição chamada macroftalmia, que se refere ao crescimento anormal do olho.

Lampreia-de-bolsa

Esse tipo de lampreia se destaca por apresentar uma bolsa de pele, que se estende desde a borda da boca até a primeira abertura branquial. Essa bolsa é mais desenvolvida nos machos do que nas fêmeas. Suas barbatanas são pigmentadas e possuem várias dobras.

Esse ágnato com bolsa responde à espécie Geotria australis, que passa por um único processo reprodutivo em água doce, para posteriormente migrar para o mar e se desenvolver. Distribui-se nas águas doces do sul da Austrália e no Chile.

Lampreias de rio

Entre as lampreias que passam mais tempo em águas doces, podemos encontrar duas espécies. Contamos suas características brevemente.

Lampreia-de-riacho

Esse organismo não ultrapassa 20 centímetros de comprimento. Está presente na Europa, em rios de média altitude, convivendo com a truta-marrom. Prefere rios pequenos, com correntes moderadas e pouca profundidade. Seu acasalamento ocorre no final da primavera.

Essa lampreia (Lampetra planeri) não é uma espécie parasita. Quando está em desenvolvimento, alimenta-se de diatomáceas e outras algas por meio da filtração. Porém, ao atingir a fase adulta, não come mais nada. É capaz de viver até 7 anos, mas seu período larval cobre a maior parte de sua vida. Sobrevive como adulto durante pouco mais de um mês, tempo suficiente para se reproduzir.

Lampetra fluviatilis

Lampetra fluviatilis é uma espécie conhecida por sua preferência por ser carnívora. Ou seja, ela usa os dentes de sua boca para rasgar os tecidos e se alimentar deles, por isso tende a se fixar às áreas com mais músculos nos peixes que usa como hospedeiros.

Essa espécie é noturna e prefere áreas rasas e bem oxigenadas. Habita geralmente águas frias com correntes baixas ou moderadas. Distribui-se ao longo da costa atlântica da Europa e da Península Ibérica.

O que são os mixinídeos?

Os mixinídeos são o segundo grupo de ágnatos que ainda existe. Seu corpo compartilha várias características com as lampreias. São alongados, com formato semelhante ao de uma cobra, seu esqueleto é cartilaginoso e apresentam apenas uma nadadeira caudal. Não ultrapassam 91 centímetros de comprimento e possuem poros, que secretam um muco que os deixa mais viscosos.

As espécies do grupo são hermafroditas, portanto apresentam tanto testículos quanto ovários. Ao contrário das lampreias, os mixinídeos são carniceiros, então eles apenas “roem” os restos de animais mortos. Seu paladar funciona de maneira diferente, pois eles usam papilas na pele para saborear os alimentos.

O muco produzido pelos mixinídeos é seu único meio de defesa. Com isso, eles esperam que a presa que os devorou os vomite ou se afogue.

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Um espécime do grupo dos mixinídeos mostrando seu aparelho oral.

Peixes sem mandíbula extintos

Esse agrupamento dos ágnatos corresponde ao grupo dos ostracodermes. Eram peixes que possuíam escamas e um escudo ósseo, que se referia a placas de osso que serviam de proteção contra predadores.

Assim como as lampreias e os mixinídeos, os ostracodermes não tinham mandíbula. Para se alimentar, eles usavam um bombeamento muscular, o que lhes permitia aspirar água, capturando presas nesse processo. De certo modo, eles se comportavam como um filtro, sugando água e se alimentando do que era carregado pela sucção.

Eles eram organismos de água doce, que se diversificaram ao longo de 150 milhões de anos. A mandíbula nasceu como um mecanismo para lidar com esse grupo, já que era necessária uma forma de “quebrar” o escudo ósseo para atacá-los. Esse é um dos motivos de sua extinção, uma vez que os ostracodermes não encontraram uma maneira de se defender dos gnatostomados, organismos com mandíbulas.

Uma das razões pelas quais o grupo ágnatos não desapareceu foi devido ao seu mecanismo de adaptação. Esses animais deixaram seus hábitos de filtração e se tornaram espécies parasitas (lampreias) ou carniceiras (mixinídeos), o que lhes deu uma nova chance de sobrevivência antes do aparecimento das espécies com mandíbula.

 

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Essas espécies apenas demonstram o impacto da seleção natural sobre os seres vivos. Apesar de serem organismos com grandes desvantagens evolutivas, os ágnatos conseguiram sobreviver ao mudar sua estratégia de vida. Essa análise nos permite entrar nas redes do tempo para tentar decifrar um pouco sobre o passado da Terra e dos organismos que nela viviam.


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