Os animais podem ficar viciados em substâncias?

Os animais, como nós, podem ficar viciados em substâncias. Sejam criadas pelo homem ou naturais do ambiente, aqui você poderá conhecer os casos mais famosos desse fenômeno.
Os animais podem ficar viciados em substâncias?

Última atualização: 03 dezembro, 2021

Os humanos tendem a pensar que apenas nós temos o desejo de consumir substâncias que alteram o sistema nervoso. No entanto, os animais também podem ficar viciados nesses produtos químicos, pois os mecanismos cerebrais afetados são semelhantes em muitas espécies (incluindo a nossa).

Seja por vontade própria ou pela ação do ser humano, muitas espécies consomem compostos que alteram seu comportamento. Se você quiser saber quais são eles, aqui estão os exemplos mais curiosos documentados até o momento. Não perca.

Modelos animais do vício

A pesquisa sobre o funcionamento e os efeitos das drogas em humanos foi realizada principalmente com animais de laboratório, como ratos, porcos e peixes (e também com primatas em outras épocas). Embora o objetivo fosse buscar o benefício do ser humano, esses experimentos nos permitiram explorar os mecanismos cerebrais do vício.

O processo neurológico por trás de um vício é semelhante entre humanos e não humanos: a dopamina e o sistema límbico são os principais responsáveis por regular os circuitos de recompensa no cérebro. Essas vias nervosas têm uma função clara, que é encorajar comportamentos repetidos que produzem prazer de forma sustentada.

Na maioria dos experimentos, os animais apresentam sinais de preferência por alimentos com substâncias que causam dependência ou as procuram ativamente, além de apresentarem sinais de abstinência quando não as recebem.

No caso específico das substâncias químicas, elas induzem a ativação ou a inibição dos receptores neuronais correspondentes, criando uma resposta condicionada e não natural para continuar consumindo o composto químico. A estrutura cerebral e o funcionamento fisiológico também mudarão a longo prazo com o uso da droga em questão.

Infelizmente, o cérebro “se acostuma” com esses picos de atividade induzidos por substâncias, daí a dependência física e emocional. Como você pode imaginar, isso também acontece em animais de laboratório expostos a drogas.

Um rato de laboratório.

Animais selvagens podem ficar viciados em substâncias?

Na natureza também existem casos de animais viciados em substâncias. Porém, não se trata de vícios no sentido que nós, humanos, damos (em que a vida de uma pessoa se deteriora com o uso da droga), e sim de um consumo recorrente devido aos agradáveis efeitos derivados.

Certamente você está se perguntando “mas quais animais podem ficar viciados em substâncias? Como você distingue entre algo que faz mal e que dá um barato? ”. Aqui estão alguns exemplos bem conhecidos para satisfazer sua curiosidade:

  • Rena (Rangifer tarandus): esses cervídeos são atraídos por cogumelos alucinógenos (Amanita muscaria). Testemunhas afirmam que depois de consumi-los, as renas correm e pulam de forma irregular, fazem barulhos estranhos e balançam a cabeça.
  • Elefante-da-savana (Loxodonta africana): os paquidermes procuram ativamente a árvore marula (Sclerocarya birrea), cujos frutos têm sabor adocicado. Quando essas frutas amadurecem, elas fermentam criando etanol. Os elefantes se comportam de forma irregular após comê-las, pois têm problemas para metabolizar esse álcool.
  • Gato doméstico (Felis silvestris catus): a história dos felinos com a erva-gateira (Nepeta cataria) é bem conhecida. Essa erva produz efeitos que variam de hiperatividade e angústia a sonolência e baba em excesso. Os grandes felinos também mostram predileção por esse vegetal.
  • Golfinhos (família Delphinidae): em 1995, após observar um grupo de golfinhos perseguindo um baiacu inchado, a bióloga Lisa Steiner levantou a hipótese de que esses cetáceos estavam se intoxicando com a tetrodotoxina que o peixe secretava ativamente. Isso ainda precisa ser confirmado, uma vez que não está descartado que o envenenamento tenha sido um acidente decorrente de uma brincadeira com o peixe.
  • Wallabies (família Macropodidae): os produtores de papoula na ilha da Tasmânia (Austrália) relatam que os wallabies entram em suas plantações para comer as plantas, que são cultivadas como matéria-prima para a produção de analgésicos. Depois de comer as papoulas, os marsupiais correm em círculos até perderem a consciência.
  • Moscas (Drosophila melanogaster): esse é um caso realmente curioso. De acordo com um estudo realizado em 2012, moscas machos privadas de acasalamento tendem a buscar o consumo de etanol. Parece que o ato de acasalar e o efeito do álcool compartilham caminhos nos sistemas de recompensa do cérebro, razão pela qual as moscas celibatárias buscam alívio artificial por meio dessa substância.

A busca pelo prazer e por novas experiências não é exclusividade do ser humano, como você pode perceber. No entanto, é aconselhável ter cautela na hora de humanizar o comportamento dos animais, pois a observação direta pode ser enganosa (como no caso dos golfinhos e dos baiacus). No final das contas, o significado de qualquer comportamento depende de quem o interpreta.

Impacto humano nos vícios animais

Existem outras situações em que os animais optam por não consumir substâncias, mas é o ser humano que polui o meio ambiente com elas. Para se ter uma ideia de como isso acontece, um estudo publicado no Journal of Experimental Biology revelou que as metanfetaminas liberadas por fábricas de produtos químicos nos rios deixavam os peixes que os habitavam viciados.

As estações de tratamento de águas residuais não conseguem eliminar a maior parte das drogas ilícitas e dos medicamentos descartados das casas, afetando as espécies autóctones.

Casos de peixes mudando de sexo também foram descritos em águas contaminadas com medicamentos contraceptivos. Outro evento documentado é o aparecimento de variações comportamentais na fauna aquática em que restos dissolvidos de antidepressivos foram derramados.

Os peixes ficam viciados em metanfetamina.

Como você pode ver, o fato de os animais também ficarem viciados em produtos químicos é uma faca de dois gumes. Por um lado, esse comportamento é curioso de observar e serve de modelo para investigar os vícios humanos. Sob uma luz mais negativa, tudo isso nos lembra da necessidade de reavaliar o impacto que exercemos em nossos companheiros de planeta.


Todas as fontes citadas foram minuciosamente revisadas por nossa equipe para garantir sua qualidade, confiabilidade, atualidade e validade. A bibliografia deste artigo foi considerada confiável e precisa academicamente ou cientificamente.


  • Horký, P., Grabic, R., Grabicová, K., Brooks, B. W., Douda, K., Slavík, O., … & Randák, T. (2021). Methamphetamine pollution elicits addiction in wild fish. Journal of Experimental Biology224(13), jeb242145.
  • Purdom, C. E., Hardiman, P. A., Bye, V. V. J., Eno, N. C., Tyler, C. R., & Sumpter, J. P. (1994). Estrogenic effects of effluents from sewage treatment works. Chemistry and Ecology8(4), 275-285.
  • McCallum, E. S., Bose, A. P., Warriner, T. R., & Balshine, S. (2017). An evaluation of behavioural endpoints: the pharmaceutical pollutant fluoxetine decreases aggression across multiple contexts in round goby (Neogobius melanostomus). Chemosphere175, 401-410.
  • Shohat-Ophir, G., Kaun, K. R., Azanchi, R., Mohammed, H., & Heberlein, U. (2012). Sexual deprivation increases ethanol intake in Drosophila. Science335(6074), 1351-1355.
  • Janiak, M. C., Pinto, S. L., Duytschaever, G., Carrigan, M. A., & Melin, A. D. (2020). Genetic evidence of widespread variation in ethanol metabolism among mammals: revisiting the ‘myth’of natural intoxication. Biology letters16(4), 20200070.
  • Vanderschuren, L. J., & Ahmed, S. H. (2013). Animal studies of addictive behavior. Cold Spring Harbor Perspectives in Medicine3(4), a011932.

Este texto é fornecido apenas para fins informativos e não substitui a consulta com um profissional. Em caso de dúvida, consulte o seu especialista.