Por que os cães enterram a comida?
Escrito e verificado por o biólogo Samuel Sanchez
Você já se perguntou por que os cães enterram a comida? Do ponto de vista antrópico, isso não faz muito sentido, já que os cães domésticos sempre têm comida à disposição, algo que certamente eles “devem saber”.
A principal razão para esse tipo de comportamento são traços vestigiais herdados de ancestrais. Não são só os cães que os apresentam, um exemplo claramente conhecido de todos é a presença de dentes do siso em uma alta porcentagem da população humana na Terra.
Sobre a domesticação canina e seus ancestrais
Para entender esse tipo de comportamento, é necessário olhar para a árvore filogenética e voltar na história evolutiva do cão doméstico (Canis lupus familiaris).
Alguns estudos genéticos tentaram elucidar o passado dos cães que hoje nos acompanham. Para a nossa surpresa, os atuais lobos e cães domésticos são dois grupos reciprocamente monofiléticos, ou seja, claramente separados.
Isso significa que o cão doméstico não é geneticamente próximo a nenhuma população de lobos atual e, portanto, seu ancestral (provavelmente algum tipo de lobo pré-histórico) já está extinto.
Por que é necessário delimitar esse tipo de relação evolutiva? Para deixar claro que, em muitos casos, para descobrir comportamentos de cães domésticos não precisamos ir até o lobo. Em todo caso, seria necessário estudar as características de seu ancestral, agora desaparecido.
Por que os cães enterram a comida?
A sociedade American Kennel Club nos dá a resposta. O acúmulo de recursos é um comportamento vestigial, que corresponde a um habitat onde o alimento é escasso.
Esse termo é conhecido em inglês como surplus killing (algo como “matar demais”) e é manifestado por muitos mamíferos, entre os quais ursos polares, linces, raposas, orcas, coiotes, guaxinins e, claro, o cão doméstico.
O comportamento de acúmulo de comida também foi observado em matilhas de lobos selvagens, à medida que enterram suas presas sob a neve, onde a carne é preservada por dias ou semanas. É um mecanismo evolutivo de fácil compreensão, pois atende a uma necessidade alimentar.
É muito interessante saber que esse hábito de enterrar o excesso de comida também se manifesta de acordo com a raça do cão. Por exemplo, cães geneticamente selecionados para a caça parecem demonstrar mais tendência a reproduzir esse comportamento do que cães treinados para o esporte.
Teoriza-se que esse grupo de caçadores mostra mais seu “instinto predatório” no dia a dia, então faz sentido que comportamentos vestigiais como o surplus killing já mencionado sejam mais aparentes.
Por essa razão, Dachshunds, Beagles, Basset Hounds e Schnauzers Miniatura são mais propensos a cavar buracos quando recebem uma recompensa.
Animais que estão de estômago cheio podem armazenar alimentos para os momentos em que os alimentos ficarem escassos.
O que fazer quando os cães enterram a comida?
Claro, reprimir um cão por um comportamento vestigial que está registrado em seu código genético não faz muito sentido. O segredo para evitar esse tipo de comportamento é canalizar a atividade de outra maneira.
Por exemplo, você pode reservar um espaço com cobertores ou travesseiros onde o cão possa enterrar seus brinquedos e pertences valiosos. Outra solução seria dar ao cão sua própria caixa de areia, onde ele possa fazer buracos sem arruinar o quintal da casa.
O tédio também pode ser um fator importante que condiciona esse comportamento. Se o tutor fornece estímulo suficiente ao cão, o animal pode não ter que usar sua parte mais instintiva para canalizar a energia. Por isso, os jogos são sempre boas soluções para problemas comportamentais.
Por fim, também é recomendável não dar ossos e guloseimas a cães que estiverem de estômago cheio. Assim, o cão não interpretará esses itens como “excesso de comida” e reduzirá o desejo de guardá-los debaixo da terra.
Um comportamento herdado, mas positivo
Como vimos, a ação de enterrar a comida é completamente normal para os cães e corresponde a um traço evolutivo vestigial. No entanto, desde que não se torne uma obsessão, reprimir o cão por mostrar seus instintos mais básicos pode ser contraproducente.
É preciso lembrar que os cães precisam de enriquecimento ambiental e de jogos que potencializem seus instintos, como atividades que promovam o olfato. Permitir que o cão eventualmente entre em contato com seu “eu” mais ancestral é necessário para que ele seja feliz.
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- Larson, G.; Bradley, D.G. (2014). “How Much Is That in Dog Years? The Advent of Canine Population Genomics”. PLOS Genetics. 10 (1): e1004093
- Why Do Dogs Bury Bones? The Answer Is Surprisingly Simple, American Kennel Club. Recogido a 1 de septiembre en https://www.akc.org/expert-advice/training/why-do-dogs-bury-bones/
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